Olá, pessoal!
Vocês já pararam para pensar na importância
do acento na língua? Refiro-me ao acento tanto em seu aspecto gráfico (marcado
pelos sinais agudos, graves ou circunflexos) quanto em seu aspecto fonético.
Vamos começar a notar as diferenças de sentido que a posição do acento ocasiona
na palavra! Para começar, tomemos dois termos cuja grafia é idêntica caso
desconsideremos a diferença dos acentos silábicos:
a) FÁBRICA: nome substantivo
(instalação industrial em que se desenvolvem produtos).
b) FABRICA: verbo na terceira
pessoa do singular (Ex.: A minha vizinha fabrica
bolsas de pano).
Os dois termos são escritos da mesma
maneira, à exceção da presença do acento agudo na primeira sílaba do item “a”.
Esse acento faz toda a diferença, já que distingue duas situações: a instalação física da indústria em que
são desenvolvidos os objetos e a ação de
desenvolver esses produtos.
O mesmo caso ocorre com várias outras palavras,
por exemplo:
c) PARA: preposição (Pretendo ir para a praia no final
desta semana).
d) PARÁ: substantivo próprio
(A minha tia mora no estado do Pará).
Também existe um famosíssimo trava-língua
que ilustra muito bem a importância da posição do acento tônico para a
distinção das palavras e dos sentidos delas:
“Sabia que o sabiá sabia
assobiar?
A sábia não sabia
que o sábio sabia
que o sabiá sabia
que o sábio não sabia
que o sabiá não sabia
que a sábia não sabia
que o sabiá sabia assobiar.”
A sábia não sabia
que o sábio sabia
que o sabiá sabia
que o sábio não sabia
que o sabiá não sabia
que a sábia não sabia
que o sabiá sabia assobiar.”
As palavras “sabiá”, “sabia” e “sábia” são
perfeitas para mostrar que a mudança da localização do acento resulta na
alteração de sentido do vocábulo. Neste último caso, cada uma das três palavras
apresenta uma sílaba tônica diferente (SABI[Á] –
SA[BI]A
– [SÁ]BIA).
Perceberam como a sílaba tônica faz toda a diferença? E o que dizer da música “Seguindo
em frente”, de Almir Sater, especialmente neste trecho, em que fica bem
saliente a função distintiva dos acentos:
“Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs.”
Já que entramos no plano da música, vou
finalizar esta mensagem com uma canção inteligente e repleta de humor
linguístico que me foi apresentada, há algum tempo, por minha professora de
Fonologia. A música, de Zeca Baleiro, é intitulada “O parque da Juraci”; nela,
é feita uma brincadeira com os acentos das palavras de dois idiomas diferentes:
o português e o inglês. Segue a letra:
O PARQUE DA JURACI
(Zeca Baleiro)
Dedico esse tecno-xaxado a Steven Spielberg e Genival Lacerda
Pau na máquina
Pau na máquina
Juraci me convidou pra eu ir
No parque mais ela lá em birigui
E eu vesti o meu terninho engomado
Alisado, alinhado pra brincar com Juraci
No parque mais ela lá em birigui
E eu vesti o meu terninho engomado
Alisado, alinhado pra brincar com Juraci
Já no caminho eu comi um churrasquinho de charque
E um suco de saputi
E foi ficando divertido pra caramba, Juraci dançando samba
Enquanto eu lia O Guarani
E um suco de saputi
E foi ficando divertido pra caramba, Juraci dançando samba
Enquanto eu lia O Guarani
Mas lá chegando eu tive o maior susto
Tentei a todo custo não crer no que vi
no lugar do parque um self-service por quilo
Fiquei puto com aquilo e perguntei pra Juraci
Tentei a todo custo não crer no que vi
no lugar do parque um self-service por quilo
Fiquei puto com aquilo e perguntei pra Juraci
Juraci, que parque?
Juraci, que parque?
Juraci, que parque é esse que eu nunca vi?
Juraci, que parque?
Juraci, que parque é esse que eu nunca vi?
Juraci, que parque?
Juraci, que parque?
Juro por Deus que eu quebrei o pau com Juraci
Juraci, que parque?
Juro por Deus que eu quebrei o pau com Juraci
[...]
No refrão, o efeito chistoso da música é criado pela referência ao
filme norte-americano Jurassic Park,
de Steven Spielberg. Soma-se à proximidade sonora das palavras “Jurassic Park”
e “Juraci, que parque?” a semelhança do posicionamento da sílaba com maior
tonicidade em Língua Portuguesa. Na realidade, há, na fala, uma manipulação dos
acentos mais proeminentes para que seja criada maior similaridade entre as duas
sequências nos dois idiomas. Explico-me melhor...
No dia-a-dia, é comum pronunciarmos algumas expressões da Língua
Inglesa de maneira mais “aportuguesada”, como no caso de “Jurassic Park”. Muitas pessoas, em vez de pronunciarem em inglês o
título do filme, tentam adaptar o “sotaque” para o português. Nesse caso, a
posição do acento é alterada e a proximidade com a expressão “Juraci, que
parque?”, em termos acústicos, torna-se maior.
Jurassic
Park (acento em inglês)
Jurassic
Park (acento em inglês “aportuguesado”)
Juraci
que parque [a fronteira entre a sílaba tônica “-ci” e a
palavra “que” quase desaparece na fala]
Manipulamos, no nosso cotidiano, a localização do acento e criamos, com
isso, situações de ambiguidade e de comicidade, como a da música de Zeca
Baleiro.
Valeu, pessoal! Até mais!
***LEMBRETE:
Nem sempre a sílaba tônica (a
mais forte da palavra) é marcada por acento gráfico. Algumas vezes, o acento é
apenas de natureza fonética, como na palavra “saBIa”
(verbo na terceira pessoa do singular), em que a sílaba tônica (“-bi”) não recebe
acentuação gráfica.
https://www.youtube.com/watch?v=UxIEdzmuWhE
https://www.youtube.com/watch?v=UxIEdzmuWhE
Quer saber mais sobre as "brincadeiras" com a acentuação fonológica das palavras e das sentenças? Veja: TENANI, L. E. Rindo das piadas, manipulando a língua. Alfa, São Paulo, n. 45, 2001.
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